RELATÓRIO ANUAL 2020
Foto: Agência Brasil -ABr, CC BY 3.0 BR via Wikimedia Commons
Mais de trinta anos depois da promulgação da primeira constituição a ter um capítulo sobre segurança pública, a Constituição Cidadã de 1988, ainda não temos uma arquitetura institucional adequada, por onde possa fluir algo parecido com uma política pública nessa área fundamental. Na ausência de elementos estruturantes para lidar com a questão, as instituições de segurança pública acabam por ter uma atribuição desmedida e o modo de atuação dessas forças acaba vincado pelo confronto armado como resposta estatal quase que exclusiva.
O resultado de todo esse descalabro são números impressionantes. Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), entre janeiro e outubro do ano de 2020, foram cometidos 4094 crimes classificados sob a designação “letalidade violenta” no território do Estado do Rio de Janeiro, uma categoria que compreende quatro ilícitos penais: o homicídio doloso, a lesão corporal seguida de morte, o latrocínio e as mortes decorrentes de intervenção de agente estatal. No mesmo período, 15 policiais morreram em serviço, entre civis e militares, segundo a mesma fonte.
O resultado cruel de um processo de subjetivação conduzido pela presença constante do conflito, é que, sobre este ambiente de trabalho, permanece um estado de desespero e tudo o mais que essa ambiência engendra: adoecimento físico e psíquico. Nesse sentido, uma pesquisa realizada no Rio de Janeiro pelo Laboratório de Análise da Violência, da UERJ, publicada em 2016, demonstrou: o elevado nível de sofrimento proporcionado pelo trabalho policial no estado, nos altos índices de comportamento e ideações suicidas entre os profissionais de Polícia Militar. De acordo com o estudo, as principais causas do fenômeno seriam a insatisfação com o trabalho (sacrifício inútil); com as amizades de trabalho (relacionamento interpessoal) e com os recursos materiais oferecidos pela instituição.
A ausência de um sistema nacional que articule ações de médio e longo prazo entre os níveis federativos; o descontrole sobre a circulação de armas e munições no território brasileiro; uma política de drogas centrada na perspectiva do confronto bélico; a precarização das instituições de segurança pública; a escassez de recursos financeiros; uma governança deficiente: todas essas desconsiderações e equívocos, no limite, induzem à precarização total da atividade policial.
Em 2020, 39 policiais militares perderam suas vidas, resultado dessa política. Listamos aqui quatro casos emblemáticos, que ilustram como o trabalhador da segurança vive sob risco constante.
16 de maio – Rafael Estevão, policial militar morto em uma tentativa de roubo, em Botafogo, Rio de Janeiro
Em 16 de maio, Rafael Estevão, policial militar, foi morto durante uma tentativa de roubo que ocorreu no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro. Rafael dirigia uma moto e foi abordado por suspeitos em uma outra moto, de onde efetuaram os disparos. O policial trabalhava no Centro de Controle Operacional da Polícia Militar.
29 de novembro – Paulo Roberto dos Santos Ferreira Junior, de 36 anos, policial militar morto com tiro na cabeça durante troca de tiros na Rodovia Washington Luiz
Em 29 de novembro, Paulo Roberto dos Santos Ferreira Junior, de 36 anos, policial militar foi morto com um tiro na cabeça, durante troca de tiros na Rodovia Washington Luiz, próximo a Duque de Caxias. A Polícia Militar informou que os policiais efetuaram disparos para tentar impedir um roubo de carga, na troca de tiros Paulo Roberto foi ferido. Ele foi levado para o Hospital Moacyr do Carmo, mas não resistiu aos ferimentos. O policial era lotado no 15° BPM (Duque de Caxias) e deixou esposa e duas filhas.
4 de dezembro – Derinalto Cardoso dos Santos, de 34 anos, policial morto com tiro na cabeça durante assalto, em Mesquita
Em 4 de dezembro, Derinalto Cardoso dos Santos, de 34 anos, policial militar, foi morto ao tentar impedir um assalto a uma loja em Mesquita, Baixada Fluminense. Derinaldo foi atingido com um tiro na cabeça, socorrido e levado para o Hospital Geral de Nova Iguaçu, mas não resistiu aos ferimentos. O cabo lotado no 20° BPM (Mesquita) era casado e tinha dois filhos.
5 de dezembro – Douglas Constantino Barbosa, de 37 anos, policial morto em Nova Iguaçu
Em 5 de dezembro, Douglas Constantino Barbosa, de 37 anos, foi morto a tiros quando estava em uma loja. Testemunhas contam que dois homens encapuzados desceram do carro e efetuaram os disparos. O cabo foi levado para o Hospital Geral de Nova Iguaçu, mas já chegou sem vida na emergência. Ele era lotado no 9° BPM (Rocha Miranda).